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Os excipientes dos medicamentos podem conter glúten?

  • Breves Questões Terapêuticas
27 Setembro 2020
Os excipientes dos medicamentos podem conter glúten?

  • A doença celíaca consiste numa resposta inflamatória à ingestão de glúten.
  • Os excipientes dos medicamentos podem provir de fontes contendo glúten.
  • Na prática, é altamente improvável que a toma de medicamentos constitua um risco.

A doença celíaca é uma patologia crónica autoimune na qual ocorre uma reação inflamatória imunológica a componentes do glúten, em indivíduos geneticamente predispostos.1-3 Causa inflamação da mucosa do intestino delgado,4-6 com atrofia das microvilosidades, o que vai resultar em mal-absorção;1,2,6 pode ainda apresentar manifestações extraintestinais.1,2,7

O termo "glúten” denomina o complexo de proteínas provenientes de cereais como o trigo, o centeio e a cevada, entre outros.1,3,5,6 A doença celíaca é causada especificamente por intolerância à gliadina, existente no trigo, e às proteínas relacionadas hordeína – cevada, e secalina – centeio.1,3

É necessária a ingestão de glúten para que a doença se manifeste,3,7 pelo que o único tratamento existente é eliminar o glúten da dieta.1-3,6 Reveste-se de especial importância identificar tanto os alimentos, como os medicamentos, que possam contê-lo.3,6

O glúten pode existir em medicamentos na forma de ingredientes inativos adicionados durante o fabrico – excipientes.2 A presença de glúten nos excipientes pode não ser aparente.3,5 Entre os que podem conter glúten encontram-se:

- Amido (trigo, cevada, centeio ou algumas variedades de cevada;2,5,7

- Amido modificado;3,5

- Amido pré-gelatinizado;2,3,5,7

- Amido desidratado, hidrogenado, hidrolisado, hidroxietilado;

- Amido octenilsulfosuccinato e derivados;

- Carboximetilamido e derivados;

- Xarope de amido;5

- Amido glicolato de sódio;2,3,7

- Qualquer ingrediente que possa ser proveniente de trigo, cevada, centeio, aveia, espelta, triticale, farro, etc.2,6

O amido e os seus derivados são excipientes de declaração obrigatória, devendo ser indicada a planta de que procedem.5 Na prática, o amido utilizado em medicamentos provém principalmente de matéria-prima livre de glúten, entre a qual se inclui o milho, a batata, o arroz ou a tapioca.3-5 Derivados, como o amido pré-gelatinizado ou o amido glicolato de sódio, são obtidos a partir de amido que pode provir de milho, trigo, batata, arroz, ou tapioca, por processamento químico. Mesmo que provenham de amido de trigo, é improvável que permaneça glúten após a sua produção.7

A vasta maioria dos medicamentos não contêm quaisquer fontes de glúten – a exceção é a presença de amido de trigo;4 contudo, são poucos os medicamentos que o contêm como excipiente.1,4

O amido de trigo utilizado em medicamentos é considerado de "qualidade farmacêutica”,4,5 produzido a partir da farinha de trigo por remoção das proteínas, contendo apenas quantidades vestigiais de glúten e de outras proteínas.4 A Farmacopeia Europeia indica que o amido de trigo não deve conter mais de 0,3% de proteína. A literatura refere que, para níveis de proteína entre 0,23-0,34%, o conteúdo em glúten varia entre <0,01-0,05%, assumindo-se que nos medicamentos não ultrapasse 100 partes por milhão (ppm), ou 100 mg/kg, sendo normalmente muito inferior. Considerando ainda a quantidade (peso) relativamente pequena de medicamentos ingeridos diariamente, a Agência Europeia do Medicamento concluiu que é altamente improvável que os níveis muito baixos de glúten existentes nos medicamentos que contêm amido de trigo possam ativar a doença.1

De acordo com as normas europeias, o amido de trigo é um excipiente de declaração obrigatória.4 É recomendado que na informação dos medicamentos se utilizem as mesmas definições relativas aos níveis de glúten estabelecidas nos regulamentos europeus para os alimentos:

- Um conteúdo em glúten que não exceda 100 mg/kg (100 ppm) deve ser indicado como "nível muito baixo de glúten”;

- Um conteúdo que não exceda 20 mg/kg (20 ppm) deve ser indicado como "isento de glúten”, sendo muito improvável que cause problemas a quem tenha doença celíaca.

Deve ainda ser indicada a quantidade total de glúten, em microgramas, por unidade de dose.1

A literatura sugere que é altamente improvável que a ingestão de menos de 10 mg/dia de glúten desencadeie manifestações da doença.1 Contudo, a exposição necessária para espoletar sintomas não é exatamente conhecida e pode variar entre indivíduos.1,4 Caso exista esta preocupação, poderá quase sempre ser recomendado um medicamento alternativo que não contenha amido de trigo.4

 

Referências bibliográficas

1. Questions and answers on wheat starch (containing gluten) used as an excipient in medicinal products for human use. EMA/CHMP/704219/2013 corr. 1. [acedido a 21-09-2020] Committee for Human Medicinal Products (CHMP), 9 October 2017. Disponível em:

https://www.ema.europa.eu/en/documents/scientific-guideline/questions-answers-wheat-starch-containing-gluten-used-excipient-medicinal-products-human-use_en.pdf

2. Cruz JE, Cocchio C, Lai PT, Hermes-DeSantis E. Gluten content of medications. Am J Health-Syst Pharm. 2015; 72(1): 54–60.

3. Johnson AN, Skaff AN, Senesac L. Medication and Supplement Use in Celiac Disease. US Pharm. 2014 [acedido a 21-09-2020]; 39(12): 44-48. Disponível em:

https://www.uspharmacist.com/article/medication-and-supplement-use-in-celiac-disease

4. What is the gluten content of medicines? Published 9th February 2016, updated 31st January 2019 [acedido a 21-09-2020]. Southampton Medicines Advice Service, UKMi. Disponível em:

https://www.sps.nhs.uk/articles/what-is-the-gluten-content-of-oral-prescription-medicines/

5. Excipientes: ¿Sustancias inertes?Boletín INFAC. 2019 [acedido a 21-09-2020]; 27(3): 17-24.

Disponível em: https://www.euskadi.eus/contenidos/informacion/cevime_infac_2019/es_def/adjuntos/INFAC_Vol_27_3_Excipientes.pdf

6. Medicamentos y Glúten. Agencia Española de Medicamentos y Productos Sanitarios en

colaboración con la Federación de Asociaciones de Celíacos de España. [acedido a 21-09-2020] Fecha de publicación: 26 de noviembre de 2018. Disponível em:

https://cima.aemps.es/cima/resources/docs/medicamentosygluten.pdf

7. Plogsted S. Medications and Celiac Disease—Tips From a Pharmacist. Practical Gastroenterology. 2007 [acedido a 21-09-2020]; 31(1). Disponível em:

https://celiac.org/main/wp-content/uploads/2009/11/Medications_and_Celiac_Disease.pdf