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Os gabapentinoides apresentam risco de uso abusivo?

  • Breves Questões Terapêuticas
30 Abril 2024
Os gabapentinoides apresentam risco de uso abusivo?
 

- A prescrição de gabapentinoides tem vindo a aumentar, inclusive em indicações não aprovadas.

    -  O seu uso abusivo pode resultar em dependência física, e a cessação abrupta pode induzir sintomas de privação.

    - Pessoas com história de abuso de substâncias ou patologias psiquiátricas parecem ter um risco acrescido para uso inapropriado destes fármacos.


      A gabapentina e a pregabalina, coletivamente designadas gabapentinoides, são derivadas do neurotransmissor ácido γ-aminobutírico (GABA). Em doses terapêuticas, causam um aumento moderado da concentração do GABA extracelular a nível cerebral. Este aumento produz efeitos GABA-miméticos ligeiros, tais como euforia e relaxamento, que se verificam especialmente no início da terapêutica e em doses supraterapêuticas.1,2

      Os gabapentinoides são amplamente utilizados na epilepsia e no tratamento sintomático da dor neuropática, como neuropatia diabética e nevralgia pós-herpética; a pregabalina é também prescrita no contexto da perturbação de ansiedade generalizada.1 A prescrição de gabapentinoides tem aumentado consideravelmente ao longo dos anos, incluindo em indicações não aprovadas – uso off-label – com evidência de suporte limitada.1,3,4 São exemplos de condições para as quais os gabapentinoides não têm aprovação a dor não neuropática1,3-5, a síndrome das pernas inquietas, a fibromialgia e a enxaqueca.3

      Potencial de Abuso e Uso Indevido

      Atualmente, reconhece-se que os gabapentinoides apresentam risco de abuso e/ou uso indevido,1,2 começando a integrar também o grupo de drogas recreativas, de acesso relativamente facilitado.1,3,4 Por isso, este potencial tem-se tornado uma preocupação crescente. Alguns indivíduos recorrem ao seu uso para aumentar o efeito de outros fármacos, para aliviar sintomas como ansiedade e dor,4 ou para mitigar sintomas de abstinência de outras substâncias.3,4

      Os indivíduos com historial ou distúrbios relacionados com o abuso de substâncias, particularmente de opioides, estão mais propensos ao abuso ou uso indevido dos gabapentinoides.1-4 Este risco é também superior em doentes com alterações psiquiátricas4 e nos jovens.2,5

      O uso abusivo de gabapentinoides envolve tipicamente a toma de doses supraterapêuticas – acima de 600 mg para a pregabalina e acima de 3600 mg para a gabapentina,2 possivelmente devido aos seus efeitos eufóricos dependentes da dose.3 Em doses elevadas, a euforia é um efeito adverso comummente associado aos gabapentinoides,5 especialmente à pregabalina.2,4 Outros efeitos experienciados com doses supraterapêuticas incluem alucinações, sociabilidade, desinibição, aumento da energia ou, contrariamente, sedação/relaxamento/calma e dissociação.2,4,5

      A pregabalina parece estar associada a maior potencial de uso abusivo face à gabapentina,1-3 o que é corroborado por reportes de farmacovigilância.2 Ao possuir um início de ação mais rápido e uma melhor biodisponibilidade,1-3,5 a pregabalina permitirá alcançar mais rapidamente os efeitos eufóricos pretendidos.2

      O uso abusivo habitual dos gabapentinoides pode conduzir a taquifilaxia4 e dependência.2-4 A taquifilaxia desenvolve-se rapidamente, existindo uma necessidade contínua de aumento de dose para atingir o efeito pretendido.2

      Os sinais e sintomas de abstinência dos gabapentinoides podem ocorrer entre 12 horas e 7 dias após a cessação abrupta do fármaco.3 Alguns destes sinais e sintomas incluem irritabilidade, tremores, convulsões, taquicardia, diaforese, insónia, cefaleias, náuseas e diarreia, ansiedade e fadiga.3-5

      O uso ilícito dos gabapentinoides está associado ao aumento do risco de comportamentos suicidas3,5 e suicídio, sobredosagem acidental e lesões graves, com consequências potencialmente fatais.3 Quando associados a fármacos sedativos e opioides, as sobredosagens por gabapentinoides podem causar depressão respiratória e insuficiência cardíaca.2-4

      Recomendações para minimização do risco

      A prescrição médica é a forma mais comum de obtenção de gabapentinoides para uso indevido. À semelhança do que acontece com os opioides e as benzodiazepinas, os gabapentinoides são usados para tratar condições em que a eficácia terapêutica é baseada em medidas subjetivas. Assim, os doentes podem sobrestimar os seus sintomas para obter doses superiores,2 as quais estão associadas a perigos significativos.4

      O uso de gabapentinoides requer especial precaução em pessoas com historial, ou distúrbios de abuso de substâncias.1,2 Nestes, a sua prescrição deve ser evitada1 ou, se tal não for possível, rigorosamente monitorizada.1,4,5

      Quando a indicação para o uso dos gabapentinoides não é clara e, particularmente, havendo risco para ocorrência de efeitos adversos, recomenda-se a desprescrição do fármaco,3 o que requer acompanhamento e redução gradual da dose ao longo de dias a semanas, para evitar a ocorrência de sintomas de privação.2,3

      Entre as medidas passíveis de mitigar os riscos associados ao abuso e/ou uso indevido da gabapentina e da pregabalina incluem-se:2,4

          • Prescrição baseada na evidência e em doses adequadas;
          • Educação dos doentes para os riscos associados;
          • Monitorização dos utentes, para detetar sinais de uso indevido;
          • Descontinuação gradual, de modo a prevenir possíveis sintomas de privação.



      Referência bibliográficas:

      1. Bonnet U, Richter EL, Isbruch K, Scherbaum N. On the addictive power of gabapentinoids: a mini-review. Psychiatr Danub. 2018 Jun;30(2):142-149. doi: 10.24869/psyd.2018.142.
      2. Hägg S, Jönsson AK, Ahlner J. Current Evidence on Abuse and Misuse of Gabapentinoids. Drug Saf. 2020 Dec;43(12):1235-1254. doi: 10.1007/s40264-020-00985-6.
      3. Athavale A, Murnion B. Gabapentinoids: a therapeutic review. Aust Prescr. 2023 Dec;46(4):80-85. doi: 10.18773/austprescr.2023.025. BIBLIOGRAPHY  l 2070
      4. Evoy KE, Sadrameli S, Contreras J, Covvey JR, Peckham AM, Morrison MD. Abuse and Misuse of Pregabalin and Gabapentin: A Systematic Review Update. Drugs. 2021 Jan;81(1):125-156. doi: 10.1007/s40265-020-01432-7
      5. Goins A, Patel K, Alles SRA. The gabapentinoid drugs and their abuse potential. Pharmacol Ther. 2021 Nov;227:107926. doi: 10.1016/j.pharmthera.2021.107926.