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Que medicamentos podem diminuir o limiar convulsivo?

  • Breves Questões Terapêuticas
28 Novembro 2023
Que medicamentos podem diminuir o limiar convulsivo?


 

- Alguns medicamentos podem alterar o equilíbrio excitatório/inibitório dos neurotransmissores, resultando em convulsões.

    -  Esta capacidade depende das características do medicamento e da suscetibilidade de cada individuo. 

    - O farmacêutico deverá identificar estes fármacos e estar alerta para os seus riscos.


      A convulsão é definida como um fenómeno paroxístico,1,2 que ocorre quando existe um excesso de atividade excitatória relativamente à atividade inibitória no cérebro.1 O glutamato e o ácido gama-aminobutírico (GABA) são, respetivamente, os principais neurotransmissores excitatórios e inibitórios do sistema nervoso central (SNC).1,3 O glutamato atua via recetores N-metil-D-aspartato, ácido alfa-amino-3-hidroxi-5-metil-4-isoxazolproprionico e recetores de cainato, causando um influxo de iões de sódio e cálcio, favorecendo a despolarização. Por sua vez o GABA atua, principalmente, através dos recetores GABAA, causando um influxo de iões de cloreto, induzindo a hiperpolarização.1,3

      O limiar convulsivo descreve a intensidade mínima de um estímulo necessária para induzir uma convulsão.1 Alguns medicamentos podem alterar o equilíbrio excitatório/inibitório dos neurotransmissores, diminuindo este limiar.1-3 Esta capacidade depende de fatores como os seus efeitos na neurotransmissão, a concentração de fármaco que alcança o cérebro, e a suscetibilidade de cada pessoa,1,3 incluindo a idade,2,3 função renal e hepática,2,3 história de convulsões, anormalidades estruturais ou funcionais do cérebro, 1,2 e o uso concomitante de outros medicamentos.1,2

      São mencionados alguns fármacos com este efeito (lista não exaustiva):

      Antibióticos
      1-5

      Os beta-lactâmicos, como as penicilinas, cefalosporinas e carbapenemos, interferem de forma dose-dependente com o efeito inibitório do GABA, através do seu anel beta-lactâmico que atua como um antagonista competitivo nos recetores GABAA.3,4 As convulsões por penicilinas e cefalosporinas estão associadas a doses elevadas ou a situações de insuficiência renal, uma vez que a sua capacidade de penetração no SNC é relativamente baixa.1 Os carbapenemos penetram mais facilmente no SNC, existindo um risco aumentado para convulsões.1 O imipenem tem sido o carbapenemo mais frequentemente associado a convulsões.4 Adicionalmente, sobretudo com o meropenem, existe uma interação direta com o valproato de sódio, levando a uma diminuição consistente e substancial da sua concentração, o que pode precipitar convulsões.1,4

      As fluoroquinolonas conseguem penetrar no SNC, interagindo com os recetores GABAB, e ativando o recetor N-metil-D aspartato, o que conduz à diminuição do limiar convulsivo.3,4 As convulsões, apesar de raras, foram reportadas, particularmente com a ciprofloxacina, em indivíduos com fatores de suscetibilidade.1,4 A administração de quinolonas em utentes tratados com fenitoína pode diminuir a sua concentração e desencadear convulsões.4

      Antimaláricos
      A mefloquina e a cloroquina podem desencadear convulsões em indivíduos com e sem epilepsia.1,2 O seu mecanismo de ação é incerto, contudo, a cloroquina parece inibir a atividade da enzima glutamato desidrogenase, reduzindo a concentração de GABA.2

      Analgésicos opioides1-5
      O tramadol tem sido associado a convulsões quando administrado tanto em sobredosagem, como em doses terapêuticas. O seu efeito indutor poderá dever-se a uma inibição das vias GABAérgicas ou ativação do recetor H1 da histamina.1 A petidina também tem demonstrado um efeito pró-convulsivante,1,2 através da redução da libertação sináptica de GABA.3

      Xantinas1,2,5
      A teofilina e a aminofilina, causam uma diminuição significativa do limiar convulsivo, podendo originar convulsões em indivíduos com ou sem epilepsia. O mecanismo foi atribuído ao antagonismo do recetor de adenosina A1.1,2

      Antipsicóticos1,2,5
      A clozapina apresenta um efeito marcado, dependente da dose, no limiar convulsivo,1-3 através da libertação de D-serina, um co-agonista dos recetores N-metil-D aspartato.3 Doentes com antecedentes de epilepsia devem ser rigorosamente observados durante a terapêutica com clozapina.7

      Antidepressores1,3,6
      O bupropiom tem um reconhecido efeito dependente da dose no risco convulsivo,1,6 devendo ser utilizado com precaução, em doses baixas, e na formulação de libertação modificada, de forma a evitar picos de concentração sérica,6 estando contraindicado em utentes com doença convulsiva atual ou qualquer antecedente de convulsões.8 A clomipramina foi também associada a uma diminuição do limiar convulsivo, pelo que deverá ser utilizada com extrema precaução em pessoas com fatores de risco.1,6

      Antidiabéticos1,5
      Apesar de não contribuírem diretamente para a diminuição do limiar convulsivo, salienta-se que estes fármacos poderão ter um efeito indireto ao induzirem hipoglicemias.

      Muitos medicamentos podem afetar adversamente o limiar convulsivo, dependendo de fatores como a concentração de fármaco que atinge o cérebro e a suscetibilidade de cada individuo aos seus efeitos.1 A sua identificação apresenta-se como uma tarefa onde o farmacêutico poderá ter um elevado impacto,5 sobretudo, na gestão dos utentes com epilepsia ou outros fatores de risco para convulsões, onde deverá existir uma elevada precaução no uso destes medicamentos.1,2,5 O prescritor deverá ser alertado para o risco convulsivo, a fim de avaliar a possibilidade de alteração para outra medicação potencialmente mais segura.1,5



      Referências bibliográficas

      1. Hitchings AW. Drugs that lower the seizure threshold. Adverse Drug React Bull 2016;298:1151. [acedido a 04-05-23].  Disponível em: https://core.ac.uk/download/pdf/46569418.pdf
      2.  Gloss D. Drug-induced seizures. MedLink®Neurology, topic last updated Mar 2023.Recomendaciones para la prevención de errores de medicación. ISMP-España. 2017. Boletín nº 45. [acedido a 29-04-23] Disponível em: http://www.ismp-espana.org/ficheros/Boletin%2045%20%28Diciembre%202017%29.pdf
      3. Larson EA, Accardi MV, Zhong Y, Paquette D, Authier S. Drug-Induced Seizures: Considerations for Underlying Molecular Mechanisms. Int J Toxicol. 2021 Oct;40(5):403-412. doi: 10.1177/10915818211040483. 
      4. Wanleenuwat P, Suntharampillai N, Iwanowski P. Antibiotic-induced epileptic seizures: mechanisms of action and clinical considerations. Seizure. 2020 Oct;81:167-174. doi: 10.1016/j.seizure.2020.08.012.
      5. Community Pharmacists’ Role in the Treatment of Epilepsy. Rice K, LaPreze J. US Pharm. 2023;48(1):17-28. [acedido a 04-05-23].  Disponível em: https://www.uspharmacist.com/article/community-pharmacists-role-in-the-treatment-of-epilepsy
      6. Johannessen Landmark C, Henning O, Johannessen SI. Proconvulsant effects of antidepressants - What is the current evidence? Epilepsy Behav. 2016 Aug;61:287-291. doi: 10.1016/j.yebeh.2016.01.029.
      7. Leponex 25 mg comprimidos. Resumo das Características do Medicamento (RCM). Set 2019 INFARMED. [acedido a 11-05-23]

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